Prática esportiva e lesões da coluna

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Você tem algum aluno/paciente que pratica esporte de modo amador ou recreacional? Que já se queixou de dores e desconfortos durante sua prática esportiva favorita? Que fica com dúvidas de quais exercícios deve fazer nos treinos para “proteger” sua coluna? Se você quer evoluir nas orientações do exercício físico para este público precisa ficar por dentro de tudo que envolve um processo de lesão. 

Vamos juntos #deolhonomovimento

Para discutirmos as lesões da coluna nas práticas esportivas gostaria de propor dois pontos: 

1- Considerando as demandas biomecânicas e fisiológicas do esporte praticado;

2- Considerando aspectos psicossociais do nosso aluno/paciente;

De um modo geral, ao recebermos alguém para treinar que relata que pratica um esporte e que costuma sentir desconfortos na coluna durante a prática, teremos que pensar em dois pontos para reduzir as chances de algumas lesões.

Pensando no ponto 1:

Estudos mostram vários padrões de lesão na coluna lombar em atletas (Ball et al,2019; Hassebrock et al,2019). Apesar deste texto trazer reflexões para planejamento dos treinos dos nossos alunos/pacientes que são atletas recreacionais, as pesquisas com os atletas profissionais nos trazem muitos insights sobre como conduzir o treinamento nos quadros de lesões e o que podemos fazer para evitar as que são evitáveis.

Por exemplo, planejar um treino para prevenir lesões da coluna em um corredor de rua é bem diferente de planejar os treinos de uma pessoa que pratica tênis ou joga futebol aos finais de semana. Na corrida temos uma mecânica de movimento linear e na grande maioria dos outros esportes os movimentos são multiplanares exigindo dos praticantes deslocamentos para frente, para trás, laterais, diagonais e giros. 

Além de pensarmos no esporte, temos que ter conhecimento dos mecanismos de lesão da coluna e suas repercussões. 

Quais são as principais lesões da coluna nas práticas esportivas?

Para responder esta pergunta precisamos entender os fatores de risco em cada esporte de acordo com os estudos prévios sobre prevalência e incidência. Na maior parte dos casos iremos lidar com distensões musculares e ligamentares, degeneração discal e facetária, hérnias de disco, fraturas, espondilólise e espondilolistese.

Estudo epidemiológico publicado no The Orthopaedic Journal of Sports Medicine em 2019 nos traz dados epidemiológicos das lesões da coluna lombar registrados na National Collegiate Athletic Association (NCAA) no período acadêmico de 2009/2010 a 2014/2015 usando o Programa de Vigilância de Lesões da NCAA: 

  • Eles mostraram que o número total de lesões da coluna lombar foi maior durante a preparação física (n = 851); no entanto, a taxa de lesões durante as competições foi maior (3,58 vs 2,72 de 10.000 exposições). Os mecanismos de lesão sem contato foram os mais comuns (n ​​= 20.467; 40%), com lesões por uso excessivo compreendendo a segunda maior proporção geral (n = 13.926; 27%) de lesões na lombar.
  • Os esportes com as maiores taxas de recorrência de lesões na coluna lombar foram atletismo masculino, tênis masculino e atletismo feminino (43,15%, 37,95% e 35,01%, respectivamente).
  • Entre todas as lesões da coluna lombar incluídas no conjunto de dados, a maioria foi classificada como dor lombar (n = 23.119; 45%). As distensões na região lombar também foram os tipos mais comuns de lesão nos esportes comparáveis ​​para o público masculino e feminino (47% e 44%, respectivamente). O segundo tipo de lesão mais comum foi a dor inespecífica; isso representou 40% do total de tipos de lesões.
  • As altas taxas gerais de lesões deste estudo complementam a literatura anterior, que já demonstrou uma alta taxa de lesões associadas à coluna lombar em atletas universitários.

Nesta outro estudo de revisão que buscou identificar pesquisas de prevalência de dor lombar lombar em atletas, foi demonstrado um alta prevalência pontual de lombalgia nos esquiadores, nos jogadores de floorball e nos remadores. 

  • Os dados extraídos também mostraram que os remadores tiveram a maior taxa de prevalência de lombalgia ao longo da vida. Esses achados são plausíveis, uma vez que o esqui e o floorball requerem uma posição flexionada da coluna, membros inferiores e movimentos repetitivos de torção. Com relação ao remo a exigência podemos pensar na flexão cíclica e altas cargas de rotação. 

De passe e colegas também buscaram identificar as atividades esportivas mais comumente associadas com distensões e fraturas da coluna cervical nos Estados Unidos. Para isso utilizaram o banco de dados do Sistema Eletrônico Nacional de Vigilância de Lesões (NEISS), que coleta informações sobre os pacientes que se apresentam aos departamentos de emergência em 100 hospitais nos Estados Unidos. 

  • Com relação às lesões não traumáticas, o futebol foi a principal causa de lesão cervical neste estudo, sendo a maioria distensões. Também foi observado um crescimento de 66% de distensões durante a prática de levantamento de peso, muito provavelmente pelo crescimento desta prática esportiva tanto no público masculino quanto feminino. 

Revisão sistemática e metanálise publicada no British Journal of Sports Medicine em 2021 pesquisou a prevalência de dor lombar em atletas adultos e verificou que um dos fatores de risco mais comumente associados à dor lombar em todos os esportes foram altos volumes de treinamento e sobrecarga das competições.

  • Os autores reportaram uma dificuldade de comparação entre os estudos incluídos pelo fato de divergências na definição de dor lombar utilizada em cada um deles e severidade da dor. Outra questão levantada foi a falta da inclusão de aspectos biopsicossociais nas pesquisas.
  • Foi possível observar com esta revisão que os fatores de risco para dor lombar em atletas são semelhantes aos não atletas, e que é possível que um bom gerenciamento de carga nos atletas possa influenciar no risco de um episódio de lombalgia.

Todos estes dados levantados nas pesquisas citadas acima nos auxiliam a pensar na orientação do exercício físico, pois podemos raciocinar sobre quais estímulos irão favorecer um melhor desempenho na prática. Mas como as lesões são multifatoriais isso nos leva ao ponto 2 da discussão.

Pensando no ponto 2:

As dores e lesões podem ser agudas ou se tornarem crônicas e quando falamos em DOR LOMBAR também sabemos que grande parte da população sofre com a lombalgia crônica. Com isso, não adianta olharmos somente para aspectos do treino quando uma pessoa com este quadro nos procura. Teremos que avaliar aspectos da rotina de vida, do trabalho, da alimentação, do convívio social, da família, do ambiente para prática de atividade física/esportiva.

Após esta investigação e entendimento da influência dos pontos 1 e 2 no contexto da lesão e dor do seu aluno/paciente poderemos direcionar os treinos avaliando sintomas ou pensar em programas preventivos de acordo com a atividade esportiva praticada. Nos casos de tratamentos em andamento, para o avanço da prática visando qualidade de vida a longo prazo é preciso que nosso aluno/paciente apresente boa amplitude de movimento da coluna, capacidade de realizar os movimentos exigidos do esporte sem DOR ou com dor autorelatada pela escala visual numérica em torno de 3.

Gostaria de aprofundar seus estudos em dor lombar? Leia também:

Metanálise sobre prognóstico da dor lombar aguda e persistente: https://www.cmaj.ca/content/184/11/E613.short

Metanálise sobre tratamento da dor lombar em atletas: https://bjsm.bmj.com/content/55/12/656.abstract

Quer saber mais? Fale comigo, tire todas as suas dúvidas e vamos juntos #deolhonomovimento!